Sobre a experiência de ver um espetáculo de dança online na quarentena
Somos todos quadrados numa tela. O que é, sem dúvidas, uma merda. Isso posto, como é que podemos seguir a vida? O que é que dá pra tirar dessa situação?
O pessoal da Urze ofereceu uma resposta. Eles estrearam, em agosto, o espetáculo “Para dentro dos meus olhos o seu olhar”. Online, ao vivo, cada dançarino na sua própria casa. Cada dançarino, um quadrado na tela.
Foi impossível ver sem pensar em solidão, mas também em simultaneidade. Em como fomos colocados em situações tão parecidas, e em como a dança, com sua própria forma, pode refletir subjetiva e objetivamente essas circunstâncias.
Os movimentos de cada dançarino, assim como os nossos próprios movimentos, são limitados pelo espaço dos cômodos da casa. Alguns têm maior amplitude; outros, viram-se como podem entre as quatro paredes apertadas. E assim como muitos de nós, também eles contam apenas com as próprias sombras para contracenar.
Fazer o espetáculo ao vivo foi um acerto à parte. Primeiro porque eu realmente precisava saber que a dança acontece naqueles corpos ao mesmo tempo em que aqui, no meu corpo, ela é vista. Depois, porque a falta de fluidez de alguns movimentos, comum nas transmissões ao vivo, acaba refletindo a falta de organicidade a qual estamos todos condenados desde a nossa transformação em quadrados nas telas.
Não entendo muito de dança e não me arrisco a fazer um julgamento técnico de “Para dentro dos meus olhos o seu olhar”. Mas me considero, com seis meses de experiência, especialista em quarentena, e o que posso dizer é que mais uma vez, ainda bem, a arte nos oferece algumas respostas sobre o que fazer, sobre como lidar com situações de merda.
Aliás, a Urze encenará novamente o espetáculo nos dias 09 e 10 de outubro. Recomendo bastante a experiência. Dá para comprar ingressos nesse link aqui.