CRÍTICA | ‘American Crime Story: O Assassinato de Gianni Versace’ não é lá essas coisas

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3 min readJan 23, 2019

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Imagem de Divulgação (Netflix)

O protagonista da segunda temporada de “American Crime Story” dificilmente despertará alguma empatia. E não, ele não é Gianni Versace. O estilista parece estar no título só porque precisavam de um nome famoso para diferenciar essa série das milhares de outras histórias sobre serial killers.

Pode ser que não possibilitar a identificação com um assassino tenha sido decisão deliberada. Acontece que a experiência de horas e horas acompanhando um personagem com o qual você não se importa é cansativa e, por vezes, entediante.

A história não é contada de forma linear. E não é que tenha duas ou três linhas cronológicas que avancem se alternando. Não. É uma grande salada temporal, com cenas de variados períodos que se intercalam constantemente.

A opção se justifica em alguns casos, como no da morte do estilista. Mostrar como ela acontece logo no início do primeiro episódio é impactante e aumenta a curiosidade quanto ao que levou a esse desfecho. Mas, no geral, o formato mais atrapalha do que ajuda, e é uma das coisas que dificulta a identificação com o protagonista, Andrew Cunanan.

É só perto do final que descobrimos sobre sua infância e adolescência, ambas repletas de mordomias esdrúxulas como ganhar um carro ainda criança, ou dormir no maior quarto da casa, enquanto os três irmãos mais velhos se amontoavam em colchões no chão de um cubículo.

Até que esses detalhes sejam apresentados, tudo que temos é um jovem bastante infantilizado, desses que fazem birra quando não têm seus caprichos atendidos. E parece que se tornar um criminoso foi o escalonamento natural de sua necessidade de atenção, potencializada pelo abuso de drogas.

Algumas de suas outras vítimas têm mais tempo de tela do que o próprio Versace, mas também são prejudicadas pela ordem das cenas. É só depois que as mortes trágicas se revelam que a história que as antecedem é contada. Dessa forma, o impacto da violência é sentido, mas falta material para que ela emocione.

O ponto alto da série é o retrato da homossexualidade entre as décadas de 1980 e 1990. Por possuir personagens em diferentes contextos culturais — um oficial da marinha, um estilista renomado, prostitutos viciados e por aí vai — mostra as várias dores resultantes de não se enquadrar no padrão de masculinidade e sexualidade.

Nesse ponto, dois personagens são emblemáticos. Primeiro, Antonio D’Amico, o homem com quem Versace dividiu seus últimos 15 anos de vida. A seriedade do relacionamento foi ignorada pelos policiais que cuidaram do caso e pela família do estilista que, segundo a série, exigiu que se desligasse completamente do falecido namorado, sem nenhum tipo de apoio financeiro ou emocional.

O segundo é um viciado em drogas e portador de HIV com quem Cunanan convive nos dias que antecedem o ataque a Versace. Em depoimento à polícia, ele protagoniza uma das melhores falas da série, tanto que vale a reprodução:

“Ele [Cunanan] não parava de falar sobre Versace. Mas nós todos falávamos sobre ele. Imaginávamos como seria ser tão rico e poderoso a ponto de não importar que você é gay. A verdade é que vocês tinham nojo dele bem antes de ele se tornar nojento. Vocês estão acostumados que nós nos escondamos, e a maioria de nós somos obrigados. Mas Andrew era vaidoso. Ele queria que vocês soubessem da dor dele. Ele queria que vocês soubessem como é nascer uma mentira. Andrew não está se escondendo. Ele está tentando ser visto.”

“American Crime Story: O Assassinato de Gianni Versace” é uma produção da FX e está disponível na Netflix.

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